segunda-feira, 15 de março de 2010

Azul Maré

Ele não costumava mudar de perfume. Sempre achou cheiro algo fundamental, e tinha medo de mudar e errar na novidade, algo que não provocasse e que não fosse marcante. Melhor dizendo, ele até mudava, mas só entre o perfume Vermelho e o Azul. Passava por uma fase Vermelha há muito tempo. A última vez que ele usou o Azul foi quando a menina pequena de sorriso branquinho moradora da beira do mar havia ido embora.

No último sábado, o frasco de Vermelho borrifou o que restava. Então, a decisão foi tomada: amanhã é dia de Azul. Não que o Azul seja melhor ou pior que o Vermelho, mas tava na hora de mudar de cheiro, sabor, sonhos, atitudes e até fazer a barba. Já vai fazer três anos.

Existem coisas que mudam, mas também há aquelas que não mudam nunca. Pior quando a gente acha que mudou.

De perfume novo e rotina nova, ele vai pegar sua irmã na escola. Um cara família, de fato. Mas a irmã não chegava. Mulheres sempre demoram.

SURPRESA! Um menina pequena de sorriso branquinho ali longe, e chegando perto. Vinha como uma onda chegando na praia. Ela mora na beira do mar. A onda quebrou:

- Surpresa boa! Fazendo o que por aqui?

- Vim pegar minha irmã. - disse o cara do perfume, escolhendo bem as palavras.

- Ah... Tem feito o que?

- Rotina de sempre: faculdade, estágio, espanhol e desespero de fim de curso. Coisas chatas. Só isso!

- Sempre ocupaaadíííssimo! Ah, coisa chata é vida de cursinho.

- Mas passa já! Pouquinho de paciência é bom pra todo mundo. Não que eu seja um bom exemplo disso.

É agora que a maré vira. A pequena dá um caldo no cara:

- Por falar em paciência, quando a gente senta pra conversar com calma?

Ele submergiu, alguns segundos de apneia, e furou a onda:

- Sexta? 15h?

Calmaria.

- Sexta. 15h!

É paciência foi preciso pra esperar a semana quase secular. Tem como 100 anos em uma semana? Pois acredite. Foi assim.

E lá vem o mar de longe. A maré subiu um pouco atrasada; meia hora, aproximadamente. Mulheres demoram demais. E ele doido pra dar um mergulho.

- Ahhh, desculpa! Esperou muito tempo?

- Faz quase três anos. - suspirou o mergulhador.

Pior é quando a gente acha que mudou. Tudo é sempre igual.

20 comentários:

Vitória disse...

Original! Adorei a coisa entre a menina e o mar, o mar e a menina de sorriso branquinho.
Emocionante quando ela fala "Faz quase três anos"
:)

Yuri Padilha disse...

Na verdade, ele que fala! ; )

Bianca disse...

na verdade... VOCÊ quem fala né?
gosto muito, muito, muito, muito mesmo do seu jeito de escrever. é muito bom de ler.
mas e essa declaração? será que a menina do mar lê isso aqui?
:*

Nathi disse...

Olha, alguém aqui gosta de levar caldo!

Não sou eu a "Miss Caldinho"!

Hum, e...mulheres não demoram, chegam na hora que tem de chegar.

Gostei, imaginei tudo, até o sorriso branquinho.
Beijo Homem do Perfume Azul.

Murillo Jales disse...

O amor por vezes é como um mar mesmo. Ele vem como uma onda gigante, repentina, bagunça tudo e depois vai embora...

Mas ele volta, mesmo demorando.
E as coisas nao mudam.

marcelo disse...

Engraçado, esse cara aí fala igualzinho a você. *mistério

será que a menina do mar lê isso aqui? [2]

Unknown disse...

Caraca...

Pior quando a gente acha que mudo e tudo é sempre igual. Bateu forte, viu?

Já vivi isso... e sempre acho que as coisas mudam, mas sempre resta algo que permanece na mesma. Só a maturidade é que resolve pedência, mas nem sempre a gente quer ser maduro.

Muito bom o texto, um dos melhores que já li de sua autoria. Talvez pela simplicidade, talvez pela identificação imediata. 3 anos, 1 ano, não importa... muito tempo é sempre muito tempo, nesta ou noutra vida, se assim existir... Até quando, até quando?

Beijo =*

Anônimo disse...

Um tanto interessante Padilha seu modo de descrever a situação, o tempo , as pessoas. gostei do detalhe da "menina pequena de sorriso branquinho moradora da beira do mar"..bem criativo!
concordo que as mulheres demoram demais..sou assim. sempre atrasada, nunca acerto o compasso dos passos.
"Existem coisas que mudam, mas também há aquelas que não mudam nunca. Pior quando a gente acha que mudou". Acho que todos nós já pensamos assim.. as coisas de fato não mudam, o que mudam são os momentos, as frases , os cheiros, gostos e as pessoas.. vc realmente escreve bem..vou vir aki visitar mais vezes. =) até Padilha.

GABRIEL, gustavo disse...

Não sei, não sei.

Esse foi muito real, saca?
Acho que, as vezes, a realidade me incomoda quando tentar entrar demais no nosso mundo cronístico; simplesmente porque aqui, para mim, é um refúgio dela.

Anyway.
Cê qui sab.

Yuri Padilha disse...

Se fosse tão real assim a tag não seria "Fantasia", seria "Cotidiano".

xD

Anônimo disse...

"Se fosse tão real assim a tag não seria "Fantasia", seria "Cotidiano"."
Ou não.
Quer dizer então que cotidiano não tem fantasia? tem. ah, tem. e, eu acho, isso é que o torna melhor.
como eu lhe disse, eu quero acreditar que é real, porque achei muito bonitinho :D

Nathi disse...

Rute tem toda razão, se tiro a fantasia e aquele gosto de sonho requentado da boca quando levanto às 5, juro que nem abria um olho!

Não mesmo!

Yuri Padilha disse...

Ah, Nathi, se tu acha que eu escrevo pelo menos um pouquinho bem, devia ver os textos de Rute; são ÓTIMOS!

dik!

Maliça disse...

Cotidiano ou fantasia? Tem de tudo um pouco na arte que imita a vida,que imita a arte que imita a vida...

Maíra D disse...

Que "bonitinho". Quase tres anos... antes tarde do que nunca, meu caro mergulhador! :D

marcelo disse...

Li denovo e.. putz.
Só eu que acho triste? o.O

Nathi disse...

Olha, li de novo, e não vi nada triste...desculpa aí Marcelo!

Vai ver você tá triste..não?

Yuri Padilha disse...

Disseram-me por aí que o texto é triste mesmo! Porque o ponto central não é exatamente o reencontro, mas a saudade. Tanto é que ninguém sabe como foi o reencontro, mas sabe como ele MORRIA de saudade.

; )

Haniel disse...

Achei tristíssimo.

Como Yurão falou, pense não no momento que ele diz "faz quase três anos", mas no fato de terem sido três anos. É tempo demais, mano.

Klécia Melo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.

Postar um comentário